terça-feira, 13 de janeiro de 2015

SE DEUS É BOM, POR QUE EXISTE O MAL?

Talvez você já ouviu falar do “Problema do Mal”. A expressão se refere à mais difícil pergunta da história da teologia cristã: Se Deus é onipotente e bondade, por que ele permite a existência do mal e do sofrimento? Afinal, o que quer a expressão "Problema do Mal"? Antes de tudo, é importante reconhecermos que o mal não é necessariamente um problema no sentido filosófico do termo. O conceito de problema pode ser invertido aqui. Por exemplo, uma perspectiva pessimista e ateísta que afirma a realidade do mal como experiência básica da realidade e nega o divino e o bem, teria de enfrentar o “problema do bem”. Explicando melhor: “se o universo não tem propósito e é absurdo (como sugerem alguns existencialistas ateus, por exemplo), como explicar a experiência do belo, do inefável e do prazer”? Não seria esse um grande problema filosófico? Como disse o famoso biblista autraliano Francis I. Andersen: "A rigor, a desgraça humana, ou o mal em todas as suas formas, é um problema somente para a pessoa que crê num Deus único, onipotente e todo amoroso". Isso significa que outras religiões e filosofia não enfrentam um dilema, no sentido de terem de explicar a existência do mal. Mesmo assim, o mal ainda permanece um problema para todos os sistemas de pensamento por causa da questão do sofrimento.

A tentativa cristã de lidar com esse tripé "Deus todo-poderoso", "Deus todo-amoroso" e "existência do mal", mostrando que a despeito do mal, Deus continua justo, bom e poderoso foi historicamente denominada Teodicéia. A palavra foi cunhada em 1710 pelo filósofo alemão Gottfried Leibnitz (1646-1716). Seu sentido é "justificação de Deus" (do grego theós "Deus" e dikê "justiça"). A dificuldade do problema foi bem definida pelo filósofo escocês David Hume (1711-1776) numa retomada do antigo filósofo grego Epicuro (341-270 a.C.). Conforme escreveu David Hume: “As antigas perguntas de Epicuro permanecem sem resposta. Quer ele (Deus) impedir o mal, mas não é capaz de fazê-lo? Então ele é impotente (i.e, não é onipotente). Pode ele fazê-lo, mas não o deseja? Então ele é malévolo. Não é ele tanto poderoso como o deseja fazê-lo? De onde, pois, procede o mal?

O problema do mal também é discutido e compartilhado pelo judaísmo e islamismo. A importância da discussão na tradição judaica foi expressa por Nachmânides quando se referiu ao problema do mal como “a questão mais difícil que se encontra tanto na raiz da fé quanto da apostasia, com a qual estudiosos de todas as épocas, povos e línguas têm lutado”.

Historicamente, na tentativa de construir-se essa explicação que procura manter a justiça de Deus diante do mal, vários tipos básicos de teodicéia foram elaborados. Os principais tipos respondem ao problema assim:

1. A Teoria do Livre-arbítrio

É a posição clássica das religiões monoteístas. Ela afirma que Deus permite o mal e o utiliza para fins bons. Deus permite o mal para produzir um bem maior. Nunca foi elaborada solução mais razoável e esperançosa do que a judaico-cristã. Para explicar a origem do mal, afirma-se que o mal sempre seria uma possibilidade, visto que Deus criou seres dotados de vontade livre. E para que fossem de fato livres, e não máquinas, tais seres sempre teriam a possibilidade de optar contra a vontade de Deus, dando assim origem ao mal. Portanto, a única saída para a impossibilidade plena do mal seria a inexistência de seres pessoais livres, o que nos daria um universo mecanicista, composto de seres impessoais, destituídos de arbítrio. Os defensores dessa posição ainda argumentam que Deus apenas permite o mal, o que é diferente de ser autor direto do mal, por razões e finalidades boas que não compreendemos plenamente agora. Evidentemente, a força desses argumentos depende de suas pressuposições. O argumento teísta clássico afirma que o mal pode ter início no bem, embora isto nunca seja de modo essencial. Não há derivação essencial do bem para o mal. Isso é compreensível, pois segundo o teísmo clássico o mal não existe enquanto substância, conforme mostrou Agostinho, ou seja, o mal não possui existência plena. É como a ferrugem que atinge o ferro. Não existe um ferro totalmente enferrujado, pois esse deixaria de existir. Assim como a ferrugem existe em função do ferro como elemento parasita e destruidor, também o mal só existe em função do bem.

Assim como a ferrugem existe em função do ferro como elemento parasita e destruidor, também o mal só existe em função do bem

2. A Teoria Pedagógica

Numa teodicéia pedagógica o enfoque é deslocado da origem do mal e é colocado principalmente nos possíveis bons resultados da experiência do sofrimento. A idéia é que a experiência do sofrimento (mal) é um benefício indispensável para o desenvolvimento das capacidades humanas, do contrário a humanidade permaneceria eternamente na infância. Argumenta-se, por exemplo, que um pouco de sofrimento aumenta a nossa própria satisfação com a vida e que um sofrimento maior e mais intenso desenvolve em nós uma maior profundidade de caráter e de compaixão. Além disso esta posição enfatiza a realidade de que vivemos em um mundo regulado por leis naturais e que boa parte do mal existente no mundo decorre da atuação destas leis. Deveria Deus ter criado um mundo desprovido de ordem natural para satisfazer a vontade de cada um? Isso seria bom? Todavia, há duas grandes dificuldades aqui: 1) nem sempre o sofrimento produz maturidade e aprendizado. Muitas vezes o que fica é ódio e amargura; 2) em alguns casos não há muito o que aprender e o preço pago é muito alto. Quando milhares de pessoas morrem em uma guerra, devemos perguntar: que tipo de pedagogia é essa que mata seus próprios alunos?

3. A Teoria Escatológica

Uma teodicéia escatológica diz que há esperança para o problema, pois ela está baseada na convicção de que a vida transcende a morte e que justiça e injustiça receberão sua devida recompensa. As perspectivas variam desde uma esperança entre o inaugurar de uma nova história humana por meio da ressurreição ou ainda como uma vida em um reino celestial após a morte. O futuro tem a resposta e a solução do que acontece no presente. Apesar de essa ser uma das esperanças mais enfatizadas pelas religiões monoteístas, muitos descartam esta possibilidade e questionam que tipo de reparação pode haver pela desgraça atual. Alguém que teve sua família arruinada e assassinada repentinamente pode de fato ter tal sofrimento “reparado”? Será possível isso?

4. A Teoria da Teodicéia Protelada

É uma postura de expectativa e fé em Deus a despeito do mal. A fé na soberania e bondade finais de Deus espera a compreensão de todas as questões. A diferença entre essa teodicéia e a teodicéia escatológica é a seguinte: na teodicéia protelada espera-se mais uma compreensão do que uma compensação final do mal. Argumenta-se que as limitações humanas e a tremenda distância que separa Deus do homem não nos permitem conhecer as razões da permissão do mal agora. Deve-se destacar ainda que tal posição também é diferente da idéia que sugere ser impossível avaliar o comportamento de Deus.

5. A Teoria da  Teodicéia de Comunhão

Para muitos, a experiência do sofrimento leva o homem a encontrar motivos para romper com o divino. Essa é, por exemplo, a fonte do ateísmo, do agnosticismo e do antagonismo religioso. A Teodicéia de Comunhão enfatiza que Deus é principalmente percebido e conhecido no sofrimento. O Deus verdadeiro é aquele que se compadece. É o Deus que sofre com suas criaturas e que, de certa forma, é vítima do  mal,  juntamente com elas. Esta teodicéia não explica o sofrimento imerecido. Todavia, transforma a visão sobre o sofrimento, pois o sofrer por um propósito justo é fazer a vontade de Deus e torná-lo conhecido. O sofrimento é a grande oportunidade para Deus e o homem entrarem em comunhão e colaboração. O sofrimento é transcendido e aquilo que parecia ser o pior é visto como a ocasião da mais intensa experiência religiosa.

O sofrimento é a grande oportunidade para Deus e o homem entrarem em comunhão e colaboração

6. A Rejeição da Resposta Cristã

No panorama da história, muitas correntes de pensamento apresentaram soluções alternativas para o problema, sem a intenção de justificar a Deus. Vamos apresentar um resumo daquelas posições filosóficas que tratam o problema do mal com um enfoque distinto do teísmo ou da teodicéia. As diversas propostas de resolução das relações entre o divino e o mal serão delineadas, destacando os seus principais representantes.

7. Alguns Negam a Existência do Mal

O Mal é visto como ilusão. Essa perspectiva é encontrada em conceitos monistas e panteístas. A tensão entre Deus e o mal é resolvida pela negação do mal. A cosmovisão hindu (ensinos Vedanta), Zenão (336-274 a.C.) e Spinoza (1632-1677) são exemplos desta perspectiva. Spinoza, por exemplo, chega a afirmar que o mundo parece cheio de mal apenas porque é visto de uma perspectiva humana estreita e errônea. Da perspectiva divina, porém, o mundo forma um todo necessário e perfeito. A dificuldade dessa posição é provar que os sentidos não merecem confiança alguma, visto que eles apontam para a realidade objetiva do mal. Além disso, os defensores dessa perspectiva precisam responder por que tal "ilusão" é tão comum e se mostra persistente na história humana? Que conhecimentos nos levam a tal conclusão? Seria tal conclusão uma ilusão também?

8. Alguns Negam a Existência de Deus

Essa é a perspectiva do ateísmo. É a negação da realidade de Deus. Os ateus opõem-se diretamente aos “ilusionistas”. Afirmam a realidade do mal com base nos sentidos e negam a realidade de Deus, cuja existência é incompatível com o mal. O pensamento ateísta sistematizado desenvolveu-se nos últimos dois séculos de história da filosofia ocidental, fruto do racionalismo. Os principais argumentos ateístas são: 1) Deus e o mal são mutuamente excludentes: se o mal existe, logo Deus não pode existir; 2) Se Deus existisse, ele não seria Deus propriamente dito, pois carece de bondade por permitir o mal; 3) Se Deus existisse ele não seria Deus propriamente dito, pois carece de poder visto que permite o mal.

Essa perspectiva é encontrada no budismo que pressupõe uma alienação entre o homem e o universo. O universo é impessoal e opera por causa e efeito. Não existe a figura de Deus, o sofrimento decorre da vontade humana e a sua solução se dá de maneira individual e existencial. Por isso o budista anseia pelo estado impessoal no nirvana. Esse pessimismo também encontra exemplos no pensamento grego clássico. Hegesias de Cirenaica ensinava ser a vida sem valor e que o único bem, que nunca seria alcançado, seria o prazer. Todavia esse pessimismo não marca o pensamento helênico propriamente dito que, de modo geral, acreditava na vitória sobre o mal por meio da virtude e da sabedoria.

É no pensamento europeu contemporâneo que encontraremos um exemplos dessa posição: Arthur Schopenhauer (1788-1860). Há também filósofos existencialistas ateus que enfatizam o absurdo da realidade, vendo o homem como um ser sem saída. Os principais são Jean Paul Sartre (1905-1980) e Albert Camus (1913-1960), famoso por sua obra “A Peste”. Schopenhauer cria que a realidade última é a cega vontade irracional de viver que a todos impulsiona. Tal vontade transcendental é essencialmente má, particularmente pelo fato de haver criado o nosso corpo com desejos que não podem ser satisfeitos. O sofrimento é causado pelo desejo incessante que nunca pode ser plenamente atendido. A dor e a ilusão são inevitáveis. A maior tragédia humana é o fato de ter o homem nascido.

Entre o pensamento judaico-cristão e as alegações ateístas têm surgido propostas problemáticas e incompletas que merecem ser mencionadas.

 1. Negação da bondade de Deus. Deus pode ser poderoso, mas é visto como mau e comprometido com a desgraça e o sofrimento.

2. Negação do poder de intervenção de Deus. O bem não tem poder infinito sobre o mal. Essa é a posição deísta, da teologia do processo e do teísmo aberto. Fundamenta-se na realidade da persistência do mal. O bem parece não ter poder para destruí-lo.

3. Negação do poder original de Deus. Deus foi obrigado a criar um mundo mau. Deus, sendo limitado, tinha necessidade de criar um mundo e não pode impedir que este fosse mau.

4. Negação da onisciência divina. Deus não podia prever o mal. Deus é criador, e justo, mas não é plenamente onisciente.

5. Negação da imanência divina. Deus não pode ser avaliado pelos nossos padrões morais. Desse modo não é necessário defender sua conduta. Suas ações estão numa esfera de atuação que não podemos julgar.

O Problema do Mal permanece como a questão mais difícil da história da teologia

A verdade é que o Problema do Mal permanece como a questão mais difícil da história da teologia. As outras tentativas de resolvê-lo parecem apenas tê-lo complicado ainda mais. A esperança cristã continua afirmando uma mistura das teodicéias aqui apresentadas. Mas a sua essência ecoa por toda a história: Deus permite o mal e o utiliza para fins bons, e Deus permite o mal para produzir um bem maior. Por isso, vivemos pela fé e sempre na esperança.

Luiz Alberto Teixeira Sayão
Pastor da Igreja Batista Nações Unidas (São Paulo, SP). Diretor do Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil. Linguista e hebraísta (mestrado pela USP). Tradutor da Bíblia, professor da área bíblica (Seminário Servo de Cristo e Faculdade Teológica Batista de São Paulo). Produtor e apresentador de programas bíblicos (Rádio Trans Mundial), Consultor teológico e coordenador da publicação da primeira Bíblia Brasileira de Estudos .





EU JÁ FIZ MINHA ESCOLHA

Sempre é louvável quando as igrejas batistas brasileiras voltam seus olhos para a família.  Neste ano de 2014 a CBB escolheu como tema: "Família, o Ideal de Deus para o Ser Humano".  E a divisa a partir das palavras do líder Josué também se mostra bastante apropriado: "Eu e a minha casa serviremos ao Senhor" (Josué 24:15b).

Antes de refletir um pouco sobre a declaração de Josué e suas implicações para minha vida e da minha casa e igreja, sou levado a constatar que, em geral, a expressão bíblica é usada pelo nosso povo num sentido distinto daquele em que foi proferido inicialmente em Siquém.

Do jeito que ouvimos hoje a formulação: "eu e a minha casa serviremos ao Senhor" como jargão na boca, em adesivos, camisas ou em outros souvenir e badulaques, beira a uma  formulação de magia (algo como wicca de crente!) usada para proferir promessa ou profecia auto-declarada.  É como se ao pronunciar as palavras sagradas, Deus – e o próprio universo – estivesse sendo submetido à obrigação de agregar todos da minha casa à minha fé. Parece absurdo,  mas tem sido assim... contudo, deixemos a crítica de lado, e vamos ao texto, sua análise e às suas lições, pois é o que realmente nos interessa.

Dando-me à liberdade de uma tradução mais livre do verso bíblico eu diria: Eu já fiz a minha escolha.  Eu e os da minha casa nos comprometemos em servir ao Senhor.  Lendo o contexto esta opção de tradução se esclarece melhor.  Vejamos.

O grande Josué tinha consciência que estava no final de sua jornada, e por isso  convocou os chefes nacionais para as últimas tratativas (confira Josué 23:14).  E o texto diz que líderes, juízes e oficiais de Israel compareceram diante de Deus (no primeiro verso do capítulo 24). Todos estavam ali não para ouvir um velho a murmurar ou resmungar: no meu tempo... pelo contrário, eram os anos de experiência de Josué com o seu Deus que lhe conferiam os requisitos indispensáveis para conduzir o povo na presença do Senhor e desafiar a cada um deles a uma tomada de posição.  Afinal, Deus estaria ali em Siquém.  Josué o sabia.  Israel também.

O discurso daquele dia teve como ponto de partida as poderosas ações de Deus na história do povo.  Esta é uma prática que se tornaria padrão entre os homens e mulheres de Deus na Bíblia.  Josué aprendeu desta maneira com seu mentor Moisés (atente Deuteronômio 32:7) e, depois dele, a história foi repetida em canções e serviu de base para a palavra profética (por exemplo o Salmo 136 e Ezequiel 20).  E no Novo testamento Estevão usou o mesmo método (veja Atos 7).

Nosso Deus sempre intervém e age na história dos seus, isso é graça e faz toda a diferença

A verdade é que nosso Deus sempre intervém e age na história dos seus, isso é graça e faz toda a diferença!  Josué sabia disso por experiência própria.

Por ora, preciso confessar que, em nossos ajuntamentos, sinto falta de narrações que se inspirem na Revelação e transpirem para a história e não que vagueiem de um extremo da caatinga argumentativa para o aguaceiro da experiência.  Aprendi que Deus está é no encontro da viração do dia no jardim (como é significativa a descrição deste encontro em Gênesis 3:8, “quando ouviram a voz do SENHOR Deus, que andava no jardim pela viração do dia...”
Prosseguindo com o contexto.  Foi exatamente a experiência de Josué em liderar o povo que indicou que algumas escolhas fundamentais na vida não podem ser impostas de maneira arbitrária e autoritária.  Por isso então ele apontou caminhos, deu opções.  Com base na história, o povo deveria escolher: o deus dos pais, o deus da terra, ou Deus da história.

Ainda hoje ainda uma escolha deve ser feita.  Diante de nós está a necessidade de escolhermos entre o deus estável da tradição (seja qual a for configuração religiosa ou espiritual com a qual ele se apresente), o deus sedutor da modernidade (com toda sorte de promessas ou experiências que descortinem), ou o Emanuel, o Deus que se fez história e habitou entre nós, cheio de graça e verdade (compare Mateus 1:23 com João 1:14).

É neste ponto que a liderança de Josué se destaca mais uma vez.  Antes que qualquer um dos chefes de família dissesse algo, ele tomou a dianteira e afirmou com convicção: Eu já fiz a minha escolha.  Eu e os da minha casa nos comprometemos em servir ao Senhor.  Ele não rogou bênção ou maldição (até porque já as tinha ouvido da boca de Moisés como ainda hoje eu leio em Deuteronômio 11:26-28).  Também não apelou para acalantos espirituais ou bradou impropérios.  Ele tomou uma decisão baseada no conhecimento que tinha da revelação de Deus e sua atuação na história de Israel.

Continuemos com a análise. Agora nos detendo mais na expressão de Josué.  Tive o cuidado de observar o texto em hebraico que tenho em mãos e me chamou a atenção o uso enfático do pronome de primeira pessoa: EU.  Seja qual for o encaminhamento que se dê à sentença, tudo começa com a determinação do sujeito. Pois bem, seguindo na linha de interpretação que temos adotado, Josué fez uma escolha.  Diante das opções que se lhe descortinavam e baseado nas ações de Deus na história, o líder tomou a iniciativa, foi em frente e assumiu os encargos da decisão: sou eu, eu mesmo, e não outro.  Isto é autoridade moral.

Somente quem tem tal autoridade empenhada pelo exemplo e credibilidade costurada pela caminhada pode se colocar na posição de protagonista da história familiar e se postar como padrão e modelo (entendo que as palavras de Paulo em Filipenses 3:17 podem ser lidas também nesta mesma linha de raciocínio).

Josué definiu sua escolha a partir de si mesmo.  Isto colocou sobre seus ombros as responsabilidades da decisão.  Como chefe de sua casa, ele não esperou que ninguém mais a conduzisse no serviço ao Senhor.  Nem ficou apenas esperando que tal bênção lhe fosse atribuída como por encanto. 

A lição de Josué que a mim fica demonstrada nesta disposição em primeira pessoa é que, se anseio e tenho o sonho de ver toda a minha casa rendida aos pés divinos, eu preciso pessoalmente tomar o encargo de assim conduzi-la.  E tem mais.  Só posso cobrar dos meus submissão e serviço ao Senhor se tal atitude já for padrão incontestável em minha vida.

Penso que o problema de viver tomando posse de promessas e declarações de bênção apenas é se eximir da responsabilidade.  É mais cômodo esperar que seja feito que se dispor a fazer!  Parece-me que ainda é indispensável a esta atual geração de líderes e crentes reassumir pessoalmente o papel de liderança moral diante de nossas famílias para que elas sejam colocadas no altar.

É indispensável a esta atual geração de líderes e crentes reassumir pessoalmente o papel de liderança moral diante de nossas famílias para que elas sejam colocadas no altar


E então, o que começou comigo, chega a minha casa.  Não deixa de ser curioso que, naquele momento de encruzilhada na história da nação de Israel, Josué tenha colocado como alicerce de sua escolha a sua família, não uma coletividade maior, e nem sequer mesmo a própria nação.

Fica difícil determinar se ele fez tal implicação propositadamente ou não.  Mas também não vem ao caso aqui.  A lição bíblica é esta.  Ao colocar sua casa como seu foco de escolha ele deixou um inestimável ensinamento: somente com famílias servindo ao Senhor teremos um povo encaminhado na trilha correta.

Poderíamos dizer que Josué citou sua casa porque é sobre quem teria autoridade.  Não me parecer ser o caso.  Ele chefiava Israel e poderia impor o culto ao Senhor e a exclusão dos deuses antigos e locais.  Porém, como já apontamos lá em cima, esta não seria uma decisão a se impor, mas uma escolha a ser feita consciente e responsavelmente.  E começaria pela própria casa do líder, como padrão e modelo.

Como efeito de círculos concêntricos, a escolha que começou com Josué deveria ser padrão para sua casa para, só então, influenciar a sociedade e a nação.

Tenho visto campanhas falando em educação escolar, formação de cidadania, consciência social ou moralidade pública. A verdade é que nada disso transfigurará o Brasil, a menos que comecemos em nossas casas um verdadeiro compromisso e disposição de servir ao Senhor.

Ultimamente tenho visto campanhas falando em educação escolar, formação de cidadania, consciência social ou moralidade pública (e o pior é que às vezes até nossas igrejas colocam tais proposições como prioridade em suas agendas!).  A verdade é que nada disso transfigurará o Brasil, a menos que comecemos em nossas casas um verdadeiro compromisso e disposição de servir ao Senhor. 

E sabe mais?  Sem aquilo que nos acostumamos chamar de educação cristã de berço, todo o nosso projeto eclesiástico de educação religiosa está fadado ao fracasso.  Somente quando incutirmos em nossas casas, começando pelo compromisso dos líderes, verdadeiros valores espirituais e morais como: amor a Deus e ao próximo, serviço cristão, submissão humilde entre outros é que poderemos almejar por impregnar marcas relevantes em nossa sociedade (já experimentou aplicar instruções como Lucas 10:27; Efésios 5:21 e Filipenses 2:3 em sua casa?).

Para o último destaque da fala de Josué, quero mais uma vez me fazer valer da palavra em língua hebraica.  O termo ali é servir cuja tradução e implicação mais usual é exatamente descrevendo um ato de render culto (como em Êxodo 12:25). 

Mas penso que não seria de todo uma aberração ao sentido semítico da expressão se a atrelássemos à conotação em língua portuguesa: servir como trabalhar para, ou estar à disposição de.  Mediante esta sugestão, então Josué estaria se colocando, junto a sua casa, para trabalhar e se empenhar em favor do Senhor como um servo prestativo e obediente.  Ou seja, uma família pronta para o serviço, para entregar seu suor e vontade à inteira vontade de Deus.

Creio que posso entender as palavras do apóstolo Paulo na sua despedida dos líderes de Éfeso na mesma linha (também aqui numa tradução livre): Em minha vida, nada mais importa que me gastar no serviço do Senhor Jesus (leia o discurso em Atos 20, e o verso em destaque é o 24).

Contudo, quero insistir na compreensão de serviço como culto, celebração e adoração (se não me engano, a língua inglesa costuma empregar o termo assim!).  Sendo assim, a escolha feita por Josué diante do povo, naquele dia em Siquém, seria que, começando por ele e abarcando toda a sua casa, ele preferia cultuar ao Senhor.

E aqui entendo esta como uma boa definição de culto em família.  Entendendo o culto como um estar na presença do sagrado e dele desfrutar sua companhia (já citei o episódio do Éden em Gn 3:8), então é correto afirmar que Josué escolheu permanecer na presença do Senhor, tendo-o em sua companhia, como havia sido sua experiência toda a vida.  E isso ele queria também para sua família.  Era seu compromisso.

Diante de variedade de deuses, entidades e forças cósmicas, Josué decidiu que ele e sua família só se submeteriam em adoração ao Senhor Deus com o qual já tinha experiência.  A companhia divina tinha sido certa, constante e soberana  ao longo da caminhada. 

Josué nascera ainda no Egito, ainda em tempos de escravidão, presenciou o mar aberto para que a libertação acontecesse, peregrinou pelo deserto, espiou a terra e a conquistou, sucedendo a Moisés.  Ele sabia que isso era resultado da ação direta do Senhor.  Sim, valia continuar servindo em adoração este Deus que nunca faltou em uma só de suas promessas (note a sua convicção em Josué 23:14-15). Foi assim que o grande líder israelita se comprometeu em estabelecer o culto ao Senhor como o único aceitável em sua casa.  Nada além disso.  Nada aquém disso.

Em conclusão, não posso deixar de considerar que nossas famílias hoje, de modo igual, continuam expostas a uma multiplicidade de deuses antigos e da modernidade, formatos religiosos e de culto, objetos de veneração e preocupação última. Todos eles querendo a primazia de nossa alma.  A necessidade de escolha continua então imperiosa a cada um de nós: A quem vocês vão servir?  A quem invocarão em adoração?  Quem será sua companhia e preocupação última?

Que o próprio Senhor da Igreja nos dê líderes, servos e servas que digam: Eu já fiz a minha escolha.  Eu e os da minha casa nos comprometemos em servir ao Senhor.

Jabes Nogueira Filho
Pastor auxiliar da PIB Aracaju, SE
Bacharel e Mestre em Teologia pelo STBNB (Recife/PE)
Professor do SETEBASE
jabesfilho@me.com
http://jnescrevinhando.blogspot.com

MOTIVADO PARA VENCER

Para formar vencedores, o líder, precisa ele mesmo, ser um vencedor. O presente artigo é uma ferramenta para ajudá-lo nesta dupla tarefa: ser um líder vencedor e formar vencedores.

A  pergunta que se faz é: O que motiva o ser humano?
MOTIVAR significa ter motivos, ter razões para fazer uma coisa ou deixar de fazer.

I - O QUE CARACTERIZA O SER HUMANO?

DUAS CARACTERÍSTICAS:

1. INTELIGÊNCIA:
             A Inteligência é o farol que ilumina o caminho. A Inteligência não nos faz caminhar. Ela nos dá a capacidade de discernir. A Inteligência não é livre. É livre só na sua criação. Não é absolutamente livre. Ela serve para    discernir o que eu devo ou não devo fazer. Ela é estática. Inteligência é a capacidade de vencer obstáculos. Todos são inteligentes.

2. VONTADE:
O homem é um ser que promove atos volitivos. Estes atos de vontade são absolutamente livres. O atributo da liberdade é um atributo da vontade, não da inteligência. Embora a inteligência me mostre o que eu devo fazer a minha vontade pode resolver fazer ou não fazer. O homem é o único animal capaz de fazer greve de fome. Ela é simbólica porque é um ato da vontade acima da própria inteligência.
            - muita gente é fraca de vontade
            - desenvolver a inteligência pela via da vontade
            - todos somos “ótimos começadores”e “péssimos terminadores”
            - não temos vontade sustentada
            - é preciso voltar a querer
Modernamente, o homem é mais VONTADE do que INTELIGÊNCIA.

II - QUANDO EU SOU INTELIGENTE E QUANDO EU SOU LIVRE?

1. O passado não nos pertence mais. Eu não sou livre nem inteligente no meu passado. O passado pertence à história. Já era! Um segundo, um minuto, 20 anos. Já era.
2. As pesquisas francesas dizem que nós passamos 70% do tempo revivendo o passado com sentimentos de culpa.
3. O futuro, da mesma maneira, não me pertence, seja 1 minuto, 1 hora ou 20 anos à frente. Ainda não me pertence, pertence à prospecção.
4. As pesquisas francesas provam que nós passa,os 25% do tempo antevivendo o futuro com:
 a) ansiedade - Não sou capaz! Não vou conseguir! Não foi uma cegonha que me trouxe, foi um corvo. Tudo é ruim para mim!
   b) devaneio - o devaneio é muito bonito, quando a gente é adolescente. Devaneio significa “sonhar acordado”.
5. Se 1 minuto atrás não me pertence, se 1 minuto à frente não me pertence, quando é que eu sou, quando é que eu existo?











6. Viver é portanto, debruçar toda a inteligência e toda vontade no instante presente, no momento presente   Instante. Momento.----> O mais curto é a vida! Só isto!
7. As pesquisas franceses dizem que a maioria das pessoas  vivem apenas 5% no presente. A vida só vai para a frente. A vida nunca pára. A vida nunca volta. Sempre vai.
8. Ninguém tem o direito de se economizar! Viver é concentrar toda a inteligência e toda a vontade dirigidas ao momento presente.

“ Quem achar a sua vida perdê-la-á, e quem perder a sua vida por amor de mim achá-la-á.” (Mt 10:39)
Raramente vivemos no presente. Ou estamos no passado, ou no futuro. Não nos concentramos no presente.

III - FAZER “O QUE” NO INSTANTE PRESENTE? JÁ QUE VIVER É CONCENTRAR TODA A MINHA VONTADE NO INSTANTE PRESENTE.

Só somos inteligentes e livres (vontade) no instante presente, no “aqui e agora”.
Para que serve a Inteligência?
Tudo o que fazemos na vida pode ser classificado em:

1. ESSENCIAL - É aquilo que eu posso fazer imediatamente já. É aquilo que vai me levar ao  meu objetivo de vida.
2. IMPORTANTE - É aquilo que eu devo fazer. Depois que eu já tiver feito aquilo que havia antes considerado como ESSENCIAL.
3. ACIDENTAL - É aquilo que devo fazer depois que eu já tiver feito aquilo que eu já havia antes considerado como IMPORTANTE, como ESSENCIAL. Eu  só tenho tempo para o ESSENCIAL. Eu só vou fazer o IMPORTANTE quando o IMPORTANTE torna-se ESSENCIAL.
Exemplo:
- Aos 10 anos de idade, saber se vou casar com tapete ou sem tapete é ACIDENTAL .Perto do casamento é             IMPORTANTE  saber se será com tapete ou sem tapete
- No dia do casamento, é absolutamente ESSENCIAL definir se o casamento será com tapete, ou sem tapete.
O que é ACIDENTAL pode tornar-se IMPORTANTE. O IMPORTANTE vai se tornar ESSENCIAL.
Na maioria das vezes nós invertemos a ordem das coisas: Ao invés de termos: 1) ESSENCIAL; 2) IMPORTANTE; ACIDENTAL; priorizamos o 1) ACIDENTAL; 2) IMPORTANTE; 3) ESSENCIAL

Há pessoas que estão sempre fazendo o ACIDENTAL ( vivem acidentalmente), raramente fazem o IMPORTANTE e nunca fazem o ESSENCIAL.







Nós só temos tempo para fazer uma coisa de cada vez. Só temos tempo para o ESSENCIAL. Nem para o IMPORTANTE, nem para o ACIDENTAL.

RESUMO: “VIVER É CONCENTRAR TODA A VONTADE E TODA A INTELIGÊNCIA DIRIGIDAS AO ESSENCIAL NO MOMENTO PRESENTE. “

- Se colocar meia Inteligência e toda Vontade dirigidas ao ESSENCIAL, não estarei vivendo
- Toda a Inteligência e meia Vontade no momento presente, no ESSENCIAL, também não estarei vivendo
- Toda a Inteligência e toda Vontade dirigidas ao IMPORTANTE, no momento presente, não estarei vivendo
- Se colocar toda a Inteligência e toda a Vontade dirigidas ao ESSENCIAL, no momento que não seja o presente, também não estarei vivendo.

IV - O QUE É VIVER? VIVER É TRABALHAR.

1. Das 24 horas do dia ( todos temos 24 horas - nenhum alcoólatra do trabalho tem um dia de 28 horas para trabalhar mais. Nenhum alcoólatra do ócio tem um dia de 20 horas para trabalhar menos) teoricamente divididos em três grandes grupos de 8 horas:










 2. Não tenho domínio sobre as horas de repouso, não domino a Inteligência e a Vontade. Só tenho domínio precedente: decido o que precisa/vai ser feito antes de eu dormir.

3. As 8 horas de atividades gerais são muito diversificadas, partidas, espalhadas, dispersas, são despedaçadas.

4. As 8 horas de trabalho são as horas mais concentradas e úteis do dia para usufruir de todas as potencialidades humanas. Nelas podemos/devemos concentrar toda a Inteligência e toda a Vontade naquilo que é ESSENCIAL.










6. Uma pessoa realizada é uma pessoa conhecida não por suas características pessoais, mas pelo que ela faz. As pessoas são reconhecidas pelas 8 melhores horas de trabalho multiplicadas pelos melhores 35 anos de vida.

7. Nossa missão/função é transformar as 8 melhores horas do dia em horas de realização, crescimento e desenvolvimento pessoal. Não de inveja, fofoca, ansiedade.








8. Viver é aplicar toda Inteligência e toda a Vontade naquilo que é ESSENCIAL no momento presente. (Eclesiastes 3:1-22)

9. Viver é “QUERER VIVER O INSTANTE PRESENTE”

V - SOMOS SERES SENSÍVEIS

1. Ninguém é uma linha reta.

















A linha (2) deve ser a nossa normalidade pela força da Inteligência e da Vontade. Ninguém consegue viver em “ALTA”o tempo todo ou  deveria se permitir viver em “BAIXA” o tempo todo.
Devemos usar a Inteligência e, sobre tudo, a Vontade para viver uma vida equilibrada

VI - CONSELHOS FINAIS

1. É preciso ter definição de objetivos: saiba o que é ESSENCIAL e queira o ESSENCIAL. Saber não é suficiente. É preciso querer.
2. Concentre toda a sua energia naquilo que você deseja  alcançar. Seja seletivo. Priorize as coisas, rejeite o ACIDENTAL.
3. “O homem vai longe depois de estar cansado”- Debret. Vá além do que você achou que era a sua capacidade de ir. Passe por cima do cansaço. Recomece!
4. Auto Disciplina - Seja disciplinado em função de seu objetivo.
5. Domine o comodismo fazendo uma relação (Check-list) do que deve ser feito e faça-o
6. Mantenha boa saúde física e mental
- A saúde física dói e a gente corre
- O perigo é a saúde mental - o perigo é o pessimismo, o negativismo
7. Faça exercícios
8. Faça periódica revisão de saúde
9. Saiba descansar e relaxar
10. Curta a Vida
11. Tome a iniciativa
12. Não espere muito
13. Arrisque a saída heróica
14. Faça, assuma, não se omita
15. Decida, faça, erre. Só não erra quem não faz
16. Preste atenção. Concentre-se
17. Tenha atenção controlada
18. Aprenda com os insucessos
19. Analise as causas e os erros cometidos
20. Forme um grupo. Tenha amigos
21. Desenvolva uma visão criativa
- Procure inovar
- Evite copiar
- Arrisque para conseguir algo novo
22. Administrar o Tempo  é viver. Viver é concentrar toda a inteligência e toda a vontade no que é ESSENCIAL no momento presente.
23. Seja entusiasmado com a vida
ENTUSIASMO =  “DEUS DENTRO”
Agir entusiasticamente. Entusiasmo é diferente de otimismo.
Otimismo é acreditar que vai dar certo.
Entusiasmo é ter Deus dentro da gente.  A capacidade de transformar a realidade.
24. Passe do plano do choro ao plano da ação.
25. Cada pessoa tem apenas que cumprir o seu papel para arruinar o mundo. Precisamos de pessoas que façam mais do que cumprir o dever.

“Pedí,  e   dar-se-vos-á;   buscai,   e   achareis;  batei  e abrir-se-vos-á. Pois todo o que pede,  recebe;  e quem busca, acha; e ao que bate, abrir-se-lhe-á. Ou qual dentre vós é o homem que, se seu filho lhe pedir päo, lhe dará uma pedra?” (Mt 7: 7-9)


Joaquim de Paula Rosa
Pastor. Membro da Igreja Batista em Porto da Madama, São Gonçalo, RJ.
Teólogo. Escritor. Intérprete da língua inglesa. Conferencista. Membro da Academia Evangélica de Letras do Brasil. Coordenador Geral da OMEBE – Ordem dos Ministros Evangélico no Brasil e Exterior.


OS SETE SABERES NECESSÁRIOS À EDUCAÇÃO DO FUTURO


INFORMAÇÕES [1]
Edgar Nahoun (que mais tarde adotará o sobrenome "Morin"), autor de “Os sete saberes necessários à educação do futuro” nasceu em Paris no dia 8 de julho. É o filho único de um casal de judeus sefarditas (descendentes dos judeus expulsos da Península Ibérica em 1492/1496). Desde cedo expressa sua apreciação pelo cinema, livros, música e política estando envolvido em atividades políticas desde muito cedo na Frente Popular e na Guerra Civil Espanhola. Viveu e conviveu com a segunda guerra mundial tendo nesta época influência socialista. O livro, "L’An Zéro de l’Allemagne" (O Ano Zero da Alemanha) foi o primeiro de uma série que têm sido apontados como grandes contribuições ao pensamento do século XX. Quando escreveu "L’Homme et la Mort" (O Homem e a Morte), Morin formaria a base de sua cultura transdisciplinar enfocando a geografia humana, etnografia, pré-história, psicologia infantil, psicanálise, história das religiões, ciência das mitologias, história das idéias, filosofia. Como conferencista já esteve em diversos países, inclusive no Brasil mais de uma vez participando de Congressos e Palestras em Associações e Universidades. À Morin foi solicitado pela UNESCO, escrever sobre a educação do amanhã e traz à nossas mãos a obra Os sete saberes necessários à educação do futuro  que se torna uma grande contribuição ao tema.


RESUMO
Toda sociedade regida por sua própria cultura precisa tratar de sete saberes que são considerados como necessários e fundamentais à educação do futuro, a saber:
1. As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão – uma das preocupações da educação é a transmissão de conhecimento. Entretanto é importante que esteja alerta quanto à possibilidade do ‘erro e da ilusão’.  O ser humano por sua própria natureza determina que coisas vai aceitar ou rejeitar.  A mente exclui o que não convém ou o que não consegue assimilar e para isso faz uso da razão. A racionalidade analisa e critica. A racionalização cai no perigo de se formar um modelo “mecanicista e determinista” e nega a contestação.  O ser humano em sua natureza cria as idéias e ao mesmo tempo é dirigido por elas. Muitas destas provém de sua característica a “noosfera – a esfera das coisas do espírito” (p.28). A cada momento estamos em contato com o novo e o inesperado e à educação cabe o papel possibilitar o acesso ao conhecimento. 2. Os princípios do conhecimento pertinente – um conhecimento isolado perde de seu valor quando não está inserido em conhecimentos parciais e globais. Todo conhecimento deve estar inserido no todo e não visando somente partes. O conhecimento pertinente é aquele que é capaz de situar qualquer informação em seu contexto, no conjunto em que está inserido. Para isso é necessário levar-se em conta a compreensão, a percepção do objeto, das pessoas, dos acontecimentos e as relações estabelecidas. Um desafio para a educação de hoje é essa conjugação entre as partes e o todo. 3. Ensinar a condição humana -  Compreender o ser humano com todas a múltiplas complexidades do que significa este ‘humano’ é o desafio para o futuro. Leva-se em conta sua condição cósmica pertencente a um universo complexo; sua condição física e suas potencialidades e limitações, sua condição de ser vivente terrestre, sua condição humana como ser animal. A sociedade e a cultura marcam com sua diversidade e pluralidade as características do humano e constituem desafio para a educação do futuro. 4. Ensinar a identidade terrena -  a necessidade de se conscientizar o estudante a se apropriar de sua condição terrena constitui importante aspecto. Somos todos seres pertencentes ao mesmo conjunto global. A ‘planetarização’, característica do desenvolvimento do planeta terra, traz em sua história aspectos que o une, como por exemplo, através da tecnologia e aspectos que o desunem como a não compreensão das diferenças entre as nações. 5. Enfrentar as incertezas - O mundo é uma constante de mudanças. Inovações e criações geram mudanças constroem novas perspectivas e destroem o construído. É a incerteza, é o risco. Cabe a educação ensinar o enfrentamento das incertezas ajudando o estudante a manter uma constante vigilância nas mudanças. 6. Ensinar a compreensão – A missão espiritual da educação é ajudar as pessoas a manterem um espírito colaborativo, com foco na empatia, na identificação com o outro num processo constante de re-aprender. 7. A ética do gênero Humano – A democracia chama pela autonomia dos indivíduos. Entretanto é frágil, incompleta e vive seus conflitos.  O avanço tecnológico apesar de grandes contribuições, traz o prejuízo da ‘fragmentação do saber’. A antropo-ética se propõe ao resgate do civismo da solidariedade, da responsabilidade a uma maior consciência da relação indivíduo singular e espécie humana.

CRÍTICA
A obra “Os sete saberes necessários à educação do futuro” vem atrelada ao tema central do Relatório da Comissão Internacional sobre a educação para o século XXI com enfoque no conhecer, fazer, conviver e ser. Os sete saberes apontados por Morin vêm como uma cascata interligando-se na argumentação do escritor proporcionando ao leitor uma compreensão do texto como um todo. Em cada item o leitor vai criando uma identificação com os problemas do presente século. Entretanto sua linguagem é complexa, argumentativa e exige do leitor cuidado e atenção. Quando inicia falando sobre o erro e a ilusão Morin com muita propriedade argumenta sobre como o ser humano, em contato com o conhecimento,  pode vir a se deixar levar. A educação pode ajudar o homem a ter uma consciência mais crítica. Este primeiro momento do livro se articula muito bem com o que se segue que é o conhecimento pertinente que é aquele “capaz de situar qualquer informação em seu contexto”[2] . Isabel Alarcão[3] ao falar sobre a formação de professores parte do conceito do conhecimento pertinente e diz que se este conceito é valido para a educação é igualmente válido para o que se realiza em educação, ou seja, o trabalho do professor. Para “intervir’ é preciso “analisar os contornos da crise, perceber os factores que estão na sua génese, congregar esforços e intervir sistemática e coerentemente”.[4] O item destinado à conscientização do planeta terra, identidade terrena, faz reforçar o que tem sido palco de acirradas discussões e de tantas lutas que alguns grupos levantam como bandeira. Cuidar do planeta terra, harmonizar todas as forças na busca de um modo de vida mais feliz para todos é importante tarefa da educação. A concorrência desleal a competitividade destruidora não traz benefícios para o ser humano quando visto em sua integralidade. Aliás, Morin quando se refere ao ser humano sempre o coloca como espécie, observando sua integralidade, um ser integral histórica e socialmente. A condição de humano complexo, é descrito de forma igualmente complexa constituindo uma leitura que exige esforços para sua compreensão. Enfrentar as incertezas e Ensinar a compreensão constituem, no parecer desta resenhista em um dos aspectos mais importantes de toda esta obra.  A frase “aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza” (p. 91) provoca no leitor um momento de  reflexão que o leva a parar para pensar na velocidade com que o conhecimento se desenvolve. Há que afirme que o ser humano não é capar de captar um bilionésimo de informações que estão disponíveis a ele. A incerteza decorrente desta aceleração faz lembrar das palavras de Larossa[5] que afirma que a ‘experiência’ “requer um gesto de interrupção: requer parar para pensar, parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar [...] parar para sentir, sentir mais devagar, demorar-se nos detalhes [...] falar sobre o que nos acontece, aprender a lentidão, escutar os outros, cultivar a arte do encontro, calar muito, e ter paciência e dar-se tempo e espaço”. Quando Morin delega à educação o ‘ensino das incertezas’, concorda com Larossa quanto a este momento de ‘parar para’ ... a compreensão desta complexidade do ser humano, buscando fazer com que cada experiência vivida traga um sentido e significado em meio a este ‘oceano’ de incertezas. A forma como o autor descreve a  dialética compreensão/incompreensão desafia o leitor a pensar seu papel de educador, educando, cidadão, pai, mãe, patrão, enfim, seu papel na sociedade.

Conclusão - A linguagem e o estilo literário de Morin requerem atenção e concentração do leitor. Em alguns capítulos, o desenvolvimento dos textos em sub-títulos são curtos e parecem pedir maiores esclarecimentos caracterizando um estilo de escrita. A presente obra traz uma contribuição à área da educação que recomendo ao leitor interessado no presente e no futuro da educação.


Madalena de Oliveira Molochenco
Bacharel em Teologia com especialização em Educação Religiosa,  Licenciatura em Pedagogia, Pós-graduação em Magistério do Ensino Superior e Psicopedagogia, Pós-graduação em Formação de Professores para o Ensino Religioso Escolar, Mestre em Distúrbios do Desenvolvimento, Doutoranda em Educação. Professora da Faculdade Teológica Batista de São Paulo há mais de 20 anos, onde hoje desempenha a função de Coordenação acadêmica. Membro do Comitê Consultivo de Educação Religiosa da CBB.






[1] http://edgarmorin.sescsp.org.br – acesso em 05/02/2007
[2] MORIN, Edgar. A cabeça bem feita. Rio de Janeiro : Bertrand Brasil, 2004.
[3] ALARCÃO, Isabel, professores reflexivos em uma escola reflexiva. São Paulo : Cortez, 2003
[4] Idem. p.15
[5] LAROSSA, Jorge Bondia. Nota sobre a experiência e o saber da experiência. Leituras. (Textos-subsídio ao trabalho pedagógico das Unidades da rede Municipal de Educação de Campinas). Campinas, 2001.